sábado, 18 de janeiro de 2014

MAS AFINAL, O QUE OS PROFESSORES FAZEM?

     E eis que leio no site da Universidade Estadual do Ceará (www.uece.br), que até o ano de 2030, conforme informação divulgada pela UNESCO, no dia mundial do professor, 05 de outubro, serão necessários cinco milhões de professores no mundo todo. A urgente contratação desses profissionais tenta, entre outros objetivos, fazer com que milhões de crianças tenham acesso à educação básica. A falta de professores, continua o comunicado, é mais evidente no continente africano e em países árabes. E mesmo que tal meta seja alcançada, mesmo assim um número absurdo de crianças nunca terá acesso à educação. Segundo as Nações Unidas, dos 57 milhões de crianças que não frequentam a escola, metade são meninas.
      No que diz respeito aos professores, o comunicado das Nações Unidas afirma que “os professores são a solução para a crise da aprendizagem, mas muitos são mal treinados, mal apoiados e excluídos das questões sobre políticas educacionais e das decisões que os interessam e os afetam”. E eu, cá com meus botões e minha chávena de chá de hortelã, me pergunto por qual razão somente agora essas questões estão sendo postas na mesa. E a resposta é por demais “simples”. Para o enviado especial da ONU para a Educação Global, Gordon Brown, os países estão verificando que não serão bem sucedidos se não investirem na educação. Obviamente, você nem precisa assumir tão importante cargo para saber que isso é um fato. Se os governantes ouvissem seus povos, isso não teria chegado a esse patamar desesperador e que, certamente, entrará em colapso. Em países como o Brasil, por exemplo, todas as vezes que os professores se unem e marcham por melhores condições de salários e melhorias na educação, são espancados pela polícia, ridicularizados, humilhados  e ignorados pelos governantes. A impressão que se tem é que esses profissionais são um fardo para o Estado. Já passei dos quarenta e tenho visto isso na mídia brasileira desde que era um garoto. A preocupação das autoridades para com a educação limita-se a uma retórica que não encanta mais nem a mais estúpida das serpentes.
       E dando continuidade ao seu discurso sobre a descoberta da pólvora, o senhor Brown disse: “educação não é a única maneira de fortalecer as oportunidades pessoais. Não é a única maneira de quebrar o ciclo da pobreza. Mas é uma forma de as nações se tornarem mais prósperas”. E disse mais: “a menos que consigamos contratar mais professores, teremos gerações de pessoas desempregadas e que não serão empregáveis”. As paradoxais declarações do representante das Nações Unidas apontam para um discurso recheado de “mais do mesmo”, quando não aponta, por exemplo, quais seriam as outras maneiras de fortalecer as oportunidades pessoais, por exemplo, ou quando usa os verbos ter e ser, no tempo futuro, quando em países como o Brasil, por exemplo, já se observa uma imensa massa de jovens desempregados e não empregáveis. A violência e a barbárie cotidianas são resultados do recorrente descaso com a educação e do contínuo desgaste dos professores.
        Para que até o ano de 2030 nossas crianças e jovens possam contar com cinco milhões de professores, muita água ainda precisa correr debaixo da ponte. Isso se ainda houver água em 2030. Quem, tendo em vista as péssimas condições de trabalho, o ofensivo salário pago e o recorrente desrespeito pelo qual se passa, optará pelo magistério? 2030 já está quase batendo à porta do mundo e são irrisórias as propostas apresentadas, bem como as ações implementadas pelos governos em relação à educação. “Os professores são tão explorados e desrespeitados que qualquer pessoa que escolha essa profissão hoje deve ter sua inteligência questionada e, portanto, não poderia nem mesmo ser autorizada a ensinar”. Embora rude, o comentário anterior é de uma sobriedade e tanto, se considerarmos a situação dos professores mundo afora. Se para uns ele poderia ser destruidor, para o professor Taylor Mali, foi instigador. A partir do que ouviu, o professor Mali resolveu escrever um poema sobre o valor dos professores.
       O poema chama-se “o que os professores fazem” (www.taylormali.com). Sua história e várias outras são contadas no livro Um bom professor faz toda a diferença (2013), publicado no Brasil pela editora Sextante. O livro do professor Mali não é nenhuma obra de aprofundamento intelectual sobre educação, escola, professores e alunos. O professor Mali também não é nenhum Paulo Freire. E tudo isso, junto e misturado, talvez seja o que torna o livro do professor Mali bastante interessante. Seu livro, como já vem dito na capa, é uma defesa apaixonada do trabalho dos professores e os motivos pelos quais precisamos deles mais do que nunca.
       E em pleno século XXI, ainda existe gente que não sabe o que os professores fazem. Entre outras coisas, os professores fazem seus alunos imaginarem, questionarem e criticarem. Vejam como isso é perigoso em épocas de corrupção, autoritarismo e fome de poder! E se dito dessa maneira, ainda houver quem insista na pergunta “Mas afinal, o que é que os professores fazem?”. Recorro ao final do poema do professor Mali e respondo: “Sabem o que os professores fazem?”. “Os professores fazem a diferença! E você?”.

      E se aqueles 57 milhões de crianças não puderem nunca freqüentar uma escola é por que aos professores continuou-se a negar a oportunidade de fazer a diferença. E assim sendo, 2030 pode ser tarde demais.

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