terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Todas as cartas de Clarice Lispector

 No Brasil, houve um tempo em que os textos denominados de “escritas de si” não eram vistos como material capaz de acessar a obra de escritores, escritoras, políticos e artistas em geral, de forma a ajudar na compreensão da obra. Como raras exceções, tínhamos a obra de Pedro Nava, O diário de Helena Morley e o Quarto de despejo: diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus, por exemplo. Embora se louvasse e batesse cabeça para a obra de Proust, Nava e Morley, quase nunca se falava de Carolina Maria de Jesus. Por qual razão seria, caro leitor?   

Felizmente, as coisas mudaram (precisaram mudar lá fora primeiro, é claro) e hoje tem-se uma grande quantidade de biografias, diários, autobiografias e cartas, que são fonte para muitos pesquisadores. As escritas de si constituem-se como um reflexo da vida daqueles que fazem o registro. Assim, pelo diário ou pelas cartas de um escritor é possível compreender sua posição, bem como a posição da sua arte, num determinado contexto sócio-histórico.


Neste sentido, é bastante oportuna a publicação de Todas as cartas de Clarice Lispector (2020), pela editora Rocco. Concordamos como Teresa Monteiro que, ao prefaciar a obra em questão, afirma que “Todas as cartas inaugura uma nova etapa na bibliografia clariciana ao trazer um conjunto de praticamente meia centena de cartas inéditas que abordam temas da mais alta relevância de seu itinerário literário e biográfico. Por isso, sua publicação, justamente no centenário da escritora, tem um significado especial para leitores, professores, biógrafos, pesquisadores, editores e arquivos literários. Todas as cartas ratifica o diálogo entre os três últimos e mostra o novo patamar que os arquivos literários atingiram”.

“Clarice viveu a maior parte das décadas de 1940 e 1950 no exterior, de modo que escreveu bastante neste período tanto para manter o afeto da família e dos amigos que deixara no Brasil quanto para tratar da publicação dos seus livros. Isso apesar de afirmar que “não sabia escrever cartas”, já que fugia das descrições características das missivas de viagem. Sorte nossa, pois dessa forma suas cartas são tão interessantes quanto o resto de sua produção escrita: um convite à reflexão e um espelho de uma alma em permanente indagação sobre a condição humana”. 

Além de Todas as cartas, a editora Rocco também tem publicado Todos os contos e Todas as crônicas da autora.


domingo, 6 de dezembro de 2020

SISTER LOVE: AS CARTAS DE AUDRE LORDE E PAT PARKER 1974-1989

 

Já circulava em português brasileiro algumas traduções esparsas da obra de Audre Lorde (1934-1992) e Pat Parker (1944-1989). No entanto, só recente mente é que se começou a traduzir e publicar os trabalhos de Audre Lorde de forma mais efetiva. Entre vários já publicados tem-se o Sister outsider: essays & speeches, de 1984, considerado seu trabalho em prosa mais importante. No caso de Parker, o mercado editorial brasileiro ainda não atentou para a falta de traduções da obra desta, que é uma das mais importantes escritoras do século XX. Na postagem que se segue, no entanto, não falaremos sobre a obra de Lorde nem de Parker, mas das cartas que ambas trocaram no período de 1974 até 1989.

Sem tradução no Brasil, a obra chama-se Sister Love: The Letters of Audre Lorde and Pat Parker, publicada pela Sapphic Classics, no ano de 2018. A referida publicação só foi possível devido ao apoio da filha de Parker, Anastasia Dunham-Parker-Brady e de Elizabeth Lorde-Rollins e Jonathan Rollins, herdeiros de Lorde. O livro conta com uma introdução de Mecca Jamilah Sullivan, e edição de Julie R. Enszer. Sobre como surgiu a ideia da publicação das cartas das duas poetas, procedemos à uma tradução livre daquilo que diz a editora. Tem-se:

Quando encontrei pessoalmente Marty Dunham (já tínhamos trocado e-mails), ela me falou sobre as cartas entre Pat Parker e Audre Lorde. Ela disse que se tratava de uma correspondência linda e que parte das cartas tinha sido lida em alguns eventos em homenagem a Parker e Lorde. Fiquei intrigada. Na ocasião, ela não tinha cópias para que eu pudesse ler. Dois anos depois, volteia a San Francisco, para ajudar Marty a organizar o material de Parker para a Biblioteca Schlesinger e para a pesquisa de preparação para a obra completa de Parker (The Complete Works of Pat Parker). Uma das primeiras coisas que fiz foi ler essas cartas. Eram mágicas. Encantadoras. Hipnotizantes. Estas cartas apresentam a oportunidade para que os leitores possam vislumbrar os corações e mentes de duas extraordinárias e talentosas poetas e escritoras. Tem sido um enorme prazer dedicar tempo à essas cartas e editá-las neste livro.

Parker e Lorde se encontraram pela primeira vez em 1969, quando Lorde fazia um tour literário pela Costa Oeste. Wendy Cadden, artista gráfica e membra do Women’s Press Colective, as apresentou. Lorde tinha 35 anos de idade (nascida em 18 de fevereiro de 1934) e Parker tinha 25 (nascida em 20 de janeiro de 1974). As 26 cartas dessa correspondência (27 ao todo, pois há uma última carta, de Lorde para Marty Dunham) começam em outubro de 1974 após outra visita de Lorde à Costa Oeste. A amizade de vinte e seis anos entre Parker e Lorde, que se conclui com a morte de Parker, cobre os anos mais produtivos da produção poética e intelectual das duas autoras.


Uma indicação da força da amizade das duas poetas é a dedicatória de trabalhos de uma para a outra. O poema de Parker “For Audre” (The Complete Works of Pat Parker, p.177) captura a vibração da amizade entre ambas. Lorde dedicou à Parker sua coletânea final The Marvelous Arithmetics of Distance, publicado postumamente em 1993, com as seguintes palavras: “Para minha irmã Pat Parker, poeta e camarada-em-armas In Memoriam”. A coletânea inclui o poema “Girlfriend” (namorada), que também capta algo do lúdico que havia entre elas, assim como o sentido da amizade para Lorde. Esses poemas e cartas aludem à rica amizade entre estas duas poetas. (Tradução minha da Nota da Editora, p. 115-116).

 


segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Só para maiores de cem anos, de Nicanor Parra

 

Publicado pela editora 34, com seleção e tradução de Joana Barossi e Cide Piquet, a antologia bilingue de Só para maiores de cem anos: antologia anti(poética) (2018) é a oportunidade para que o leitor brasileiro tenha uma visão geral da poesia e da antipoesia de Nicanor Parra (1914-2018), considerado um dos maiores poetas do nosso tempo.


A antologia é composta de poemas selecionados de livros do autor, que vão de 1954 até 1985. Trata-se de uma belíssima seleção organizada da seguinte maneira: De Poemas e antipoemas (1954), 13 poemas, Versos de Salão (1962), 18. Tem-se o poema “Manifesto”, de 1963, De Canções russas (1967), 12 poemas, de Obra grossa (1969), 20 poemas, de Emergency poems (1972), 05, de Folhas de Parra (1985), 06 poemas. Ao todo, Só para maiores de cem anos traz setenta e cinco poemas. A edição traz ainda um posfácio escrito por Joana Barossi.

Nicanor Parra é o principal nome da chamada antipoesia, a qual se constitui como uma poesia de ruptura, que tem na essência da sua construção determinados elementos linguísticos e culturais identificados com as classes populares. Ao optar por esse tipo de informalidade poética, Parra afastou-se da forma tradicional de se fazer poesia, isolando-se como referência entre seus pares.

Um aspecto central da produção de Parra, plenamente realizado na antipoesia, afirmam os tradutores da obra, “passa pela inversão crítica das expectativas associadas ao discurso poético elevado: “Os poetas baixaram do Olimpo”, diz um de seus poemas mais famosos, “Manifesto”. Contra o poeta demiurgo, o poeta mortal e ordinário; contra o poeta de salão, o poeta das ruas; contra o poeta cheio de si, o poeta que ri de si mesmo; contra a poesia da lua, da donzela e das flores, a poesia da tumba, do espirro e do sangue de nariz. Tal inversão se dá pela recusa dos lugares-comuns da poesia lírica e da linguagem afetada, hermética ou livresca; em seu lugar, o poeta utiliza a linguagem coloquial, a expressão natural, a língua falada no dia a dia, ainda que não linear e atravessada por outros registros, como por exemplo o do discurso religioso (via de regra com fins satíricos)  ou de extração surrealista, outra marca do autor, sempre interessado em surpreender, confundir e até importunar o leitor, tirando-o da posição confortável e passiva” (p.10-11).

Nicanor Parra

Eis a poesia de Nicanor Parra, caro leitor, um poeta que conseguia construir versos como este sobre o mar: “Este, menino, é o mar”. “Frente ao enorme senhor das batalhas” (p.25). E este, que provoca o leitor, quando diz que: “Já que as árvores são apenas móveis que se agitam/não mais que cadeiras e mesas em movimento perpétuo” (p.37); ou ainda este, de 1957, mas bastante atual: “A polícia mata por matar” (p.81).  A antipoesia de Parra não o impediu, é claro, de produzir grandes poemas líricos. No livro em questão, não se pode passar ao largo, por exemplo, do poema “Defesa de Violeta Parra” (p. 133-138), quando diz: “Que te custa mulher árvore florida/Ergue-te de corpo e alma do sepulcro/E faz estalar as pedras com tua voz/Violeta Parra”.

Só para maiores de cem anos: antologia (anti)poética, de Nicanor Parra, é leitura indicada, na verdade, para todas as idades. Leiamos!

 

 


sexta-feira, 13 de novembro de 2020

CFCH aprova concessão de título Doutora Honoris Causa a Carolina de Jesus


O Conselho de Coordenação do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) aprovou por unanimidade, em sua 880ª reunião ordinária, realizada na última segunda (09/11), o título de Doutora honoris causa à escritora Carolina Maria de Jesus. A homenagem póstuma foi sugerida pela Direção do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (Ifcs) da UFRJ. O parecer é assinado pela Comissão Acadêmica do Conselho, composta pelos conselheiros Maria Muanis, Maria de Fátima Galvão, Jeane Alves da Silva, Miriam Krenzinger e Vantuil Pereira. 

Na justificativa, a comissão destaca a relevância da escritora, nascida na década de 1910 e falecida em 1977, que é tema de 58 teses e dissertações nos últimos seis anos, de acordo com o Portal da Capes. As motivações apresentadas enfatizam ainda que Carolina Maria de Jesus é uma autora “fundamental na luta antirracista”, tendo enfrentado em vida “questões relacionadas ao que se denominou ‘racismo estrutural’ que, dentre as suas mais variadas formas de produzir o apagamento do negro da história nacional, procurou silenciar mulheres como Carolina Maria de Jesus como parte da produção da literatura brasileira”.

O documento afirma a importância da concessão do título honorífico pela necessária “reparação histórica do apagamento não de uma personalidade, mas de um segmento étnico que historicamente foi negado o lugar na cultura nacional”. Ainda de acordo com as justificativas apresentadas, o papel da Universidade, neste sentido, seria “não apenas no reconhecimento de injustiças do passado”, mas sobretudo, o da “construção de novas possibilidades e percursos para mulheres negras, cuja marca de subalternidade que alijou Carolina Maria de Jesus do espaço público e literário ainda precisa ser superada”. 

O parecer da Comissão Acadêmica concorda com a concessão do título “pelo incentivo a pesquisas que visem a elevação de figuras nacionais representativas da cultura negra; a valorização de ações culturais, no campo de ensino e da extensão, que sigam na mesma direção”. Desta forma, os conselheiros reconhecem “o apagamento das figuras negras da memória nacional”, que contou com a colaboração das próprias instituições acadêmicas, e afirmam a necessidade de “reparação que se inicia no interior da Universidade e deverá se espraiar para a sociedade com a concessão do título de Doutora Honoris Causa para toda a sociedade”. 

O parecer da Comissão Acadêmica do Conselho de Coordenação do CFCH será submetido ao Conselho Universitário (Consuni) para a concessão do título.

Clique aqui para ler o parecer da Comissão Acadêmica na íntegra.

Disponível em: http://www.cfch.ufrj.br/index.php/27-noticias/1388-cfch-aprova-concessao-de-titulo-doutora-honoris-causa-a-carolina-de-jesus


sábado, 24 de outubro de 2020

A poesia de Alejandra Pizarnik

 



Alejandra Pizarnik


A poesia de Alejandra Pizarnik (1936-1972) ainda não é conhecida do grande público do Brasil. Só recentemente é que sua obra começou a ser traduzida para o português brasileiro, com edições publicadas pela editora Relicário, em tradução de Davis Diniz. Com maestria, Pizarnik transitou pela poesia e pela prosa, com a mesma desenvoltura. 

Antes das publicações da poesia de Árvore de Diana (2018) e Os trabalhos e as noites (2018), apenas a narrativa A condessa sangrenta (2011) havia sido publicada no Brasil. No caso, pela editora Tordesilhas, com tradução de Maria Paula Gurgel Ribeiro. Sobre a obra da poeta argentina, segue o texto "a cerimônia: os trabalhos e as noites, de Alejandra Pizarnik", de Ana Martins Marques, na apresentação do livro Os trabalhos e as noites.

 

* A CERIMÔNIA

Ana Martins Marques

 

Promovendo uma inversão no título clássico de Hesíodo, Os trabalhos e os dias, poema épico composto entre o final do século 8 e o começo do século 7 a.C., Proust publicou, em 1896, Os prazeres e os dias, uma reunião de contos e poemas de juventude. Outra é a inversão operada no belo título deste livro de Alejandra Pizarnik, Os trabalhos e as noites.

 

É possível que não haja melhor título para um livro de poemas de Pizarnik, ou, talvez, para qualquer livro de poemas. Como indica o verso de Emily Dickinson, “Good morning, Midnight!”, o poeta é trabalhador da noite; seu labor é noturno, prefere o silêncio e a sombra.

 

Noite, silêncio, sombra são palavras-chave no vocabulário da poesia de Pizarnik. Trata-se, aliás, de um vocabulário bastante restrito; os poemas de Pizarnik giram em torno de um catálogo limitado de palavras e imagens: pássaro, cinza, pedra, noite, alba, infância, vento, chuva, sombra, silêncio, lilás… A partir de uma série reduzidíssima de elementos, Pizarnik compõe, como num jogo combinatório, seus poemas quase sempre muito breves, extremamente depurados, de uma terrível limpidez.

 

Alejandra Pizarnik nasceu Flora Pizarnik em 1936, em Avellaneda, cidade localizada na área metropolitana de Buenos Aires. Era filha de imigrantes russos judeus que haviam chegado à Argentina três anos antes. Seu primeiro livro de poemas, La tierra más ajena (que assinou como Flora Alejandra Pizarnik), foi publicado em 1955. A ele se seguiram La última inocencia, de 1956, e Las aventuras perdidas, de 1958. Em 1960, mudou-se para Paris, onde viveria durante quatro anos e onde manteve contato com escritores como Julio Cortázar e Octavio Paz, que escreveu uma introdução para seu livro seguinte, Árvore de Diana (igualmente lançado pela Relicário Edições em tradução de Davis Diniz).

 


Os trabalhos e as noites foi publicado em 1965, logo após o retorno de Pizarnik à Argentina. O livro é dividido em três partes, indicadas por números romanos. Ao contrário de Árvore de Diana, em que os poemas são apenas numerados, nesse livro todos os poemas têm título.

 

Encontram-se aqui vários dos elementos que marcam a poética de Pizarnik: a extrema brevidade; poemas construídos em torno de um número reduzido de palavras, quase sempre “nobres”, sem concessões ao coloquialismo ou ao pop; a ausência quase total de lugares identificáveis, referências históricas ou geográficas, cenas cotidianas; a atmosfera noturna (e soturna); uma radical negatividade.

 

É “NO”, afinal, a palavra única, com sua única sílaba, que a “dama pequeníssima/moradora no coração de um pássaro”, no poema Relógio, sai à alba para pronunciar. NO de “Não”; NO de “Noche”. O fascínio da negatividade marca a poesia de Pizarnik, em que a morte, o silêncio, o esquecimento, a sombra estão insistentemente presentes, em que a própria ausência está presente, e deixa, tatuada, sua marca no espaço: o ar é “tatuado por um ausente”, o lugar é “de ausências”, o silêncio fala, fala como a noite, fala do que não é.

 

É uma poética que não recusa o sujeito, ao contrário, mas, ao mesmo tempo, mostra-o sempre cindido, deslocado, nunca coincidente consigo mesmo: “entre mim e a que me creio” (lê-se no poema Invocações deste livro); “Dei o salto de mim à alba” (lê-se no primeiro poema de Árvore de Diana). Ou ainda partindo de si mesmo, como neste poema do livro Árvore de Diana que poderia ser tomado quase como uma definição da poesia e de sua relação com o sujeito que escreve: “explicar com palavras deste mundo/que partiu de mim um barco levando-me”.

 

Essa espécie de despossessão do sujeito de si mesmo se traduz frequentemente numa duplicação (de que são emblema os numerosos espelhos que se encontram na poesia de Pizarnik) ou numa descoincidência entre o “eu” e seu corpo, ou o “eu” e seu nome: “Eu deixei meu corpo junto à luz” (poema 1 de Árvore de Diana).

 

Além do “eu”, encontramos na poesia de Pizarnik uma série de personas, figuras nas quais frequentemente se identificaram figurações da própria poeta: a viajante, a menina muda, a adormecida, a princesa na torre mais alta, a pequena morta, a pequena esquecida, a silenciosa no deserto, além de toda uma série de bonecas, manequins e náufragas... Entre essas personas está Alice, a célebre personagem de Lewis Carroll, que aparece neste livro explicitamente no poema Infância, e também se insinua em outros poemas da autora, em especial em textos de sua última fase, por exemplo nas referências a jardins e à rainha louca nos Textos de sombra, publicados postumamente.

 

Aliás, se a de Pizarnik é uma poética muito própria, ela não se furta, no entanto, ao diálogo com outros textos e autores, o que se revela neste livro nas muitas dedicatórias (a Eva Durrell, Cristina Campo, Antonio Porchia, Jorge Gaitán Durán, Ivonne A. Bordelois, Théodore Fraenkel…), nas epígrafes (de Quevedo e Cervantes) e em alguns títulos (além da relação com Hesíodo no poema que dá nome ao livro, o título Os passos perdidos é provavelmente uma alusão a Nadja, de André Breton, que segundo César Aira era o livro preferido da autora, a ponto de ele sugerir que toda a poesia de Pizarnik poderia ser vista como “uma Nadja em primeira pessoa, escrita por sua personagem, não pelo autor”, como afirma César Aira na biografia Alejandra Pizarnik).

 

Em seu livro dedicado à poeta argentina, Aira critica veementemente o uso, muito frequente na crítica, de epítetos como “a pequena náufraga” ou “a menina extraviada” para se referir à autora. Se Pizarnik não poupou metáforas autobiográficas em sua poesia, diz Aira, isso, no entanto, “não é desculpa para usá-las contra ela, sobretudo porque ao fazê-lo se está confundindo a poesia já feita e a poesia em vias de se fazer”. As figuras são para Alejandra motor para a escrita, um modo de continuar fazendo poesia; identificá-las à poeta já morta, diz Aira, impede a visão do seu processo de escrita e é um modo de reduzi-la “a uma espécie de bibelô decorativo na estante da literatura”.

 

Em Os trabalhos e as noites, essas figurações autobiográficas dividem a cena da escrita com um “tu” insistente a que muitos poemas do livro se dirigem. Um “tu” que parece oscilar entre alguém a quem o poema se endereçaria (frequentemente num modo amoroso, muito acentuado neste livro), o próprio enunciador, o leitor (que pela força do dêitico vem ocupar o lugar daquele a quem o poema se destina) e o próprio poema.

 

“Tu” é, aliás, a primeira palavra do primeiro texto do livro Poema. Um “tu” que, aqui, parece referir-se ao próprio poema (o título funcionando então como uma espécie de vocativo): “Tu fazes de minha vida/ esta cerimônia demasiado pura”. A demanda/exigência de pureza parece atravessar a escrita de Pizarnik, com seus versos concisos, rigorosos, reduzidos a uma espécie de limpidez elementar: pedras preciosas. Que aqui essa exigência, associada à vida, pareça “demasiada”, é indicativo do caráter sempre problemático da relação entre literatura e vida, o que, no caso de Pizarnik, adquire um viés trágico, se se leva em conta seu suicídio, em 1972, aos 36 anos.

 

A tentação biográfica em que frequentemente recaem as leituras de sua obra é compreensível: a morte está no centro da poesia de Pizarnik. “O desejo de morrer é rei”, lê-se no segundo poema deste livro, Revelações. Em Infância, “alguém entra na morte/com os olhos abertos/como Alice no país do já visto”. E em Silêncios, a morte, “sempre ao lado”, é afinal identificada à própria voz que fala no poema: “A morte sempre ao lado/Escuto seu dizer/Só me ouço”. Em Os trabalhos e as noites, no entanto, a morte divide a cena com o amor, ainda que ausente, ainda que apenas evocado ou lembrado…

 

Nomear o ausente parece ser a tarefa, sempre malograda, a que esta poesia se lança. Não por acaso, grande parte dos poemas gira em torno da própria linguagem, e sua contraparte, o silêncio (numa dinâmica de contrastes e inversões que também abarca outros pares na poesia de Pizarnik: memória/olvido, morte/vida, presença/ausência, liberdade/prisão, pássaro/gaiola...). O poema como cerimônia de nomeação (e como seu fracasso). Recusando a bela formulação de Breton – Les mots font l’amour (As palavras não fazem amor) –, Alejandra, que tanto bebeu do surrealismo, dirá, no poema intitulado En esta noche, en este mundo, que “las palabras/ no hacen el amor/ hacen la ausencia/ si digo agua ¿beberé?/ si digo pan ¿comeré?”.

 

Essa dinâmica de presença/ausência, palavra/silêncio encontra na poesia da autora, e em especial neste livro, uma imagem poderosa no repetido elemento “muro”. O muro é superfície da escrita (e do desenho, ainda que feito pelo tempo, como “a cor do tempo em um muro abandonado” no poema que encerra este livro, como as fissuras que em Quarto só formam, em uma velha parede, “rostos, esfinges/ mãos, clepsidras”...), mas também parece ser o obstáculo contra o qual a linguagem se bate (“é muro é mero muro é mudo mira morre”, lê-se no poema que toma seu título do poema anterior, A verdade desta velha parede). No poema Madrugada (para além da noite, há neste livro muitas alusões a essas horas de transição ou passagem entre o dia e a noite: a alba, o crepúsculo, a madrugada...), é o próprio apagamento do “eu” que se identifica ao apagamento da escrita, ao apagamento do poema escrito num muro:

 

[...]

 

O vento e a chuva me apagaram

como a um fogo, como a um poema

escrito num muro

 

Numa entrevista, o poeta norte-americano Ben Lerner afirma que o fracasso do poema em alcançar a margem direita da página é para ele uma forma quase definidora do modo como a poesia faz com que a ausência seja sentida como presença. Essa capacidade de presentificar a ausência pelo vazio da página se faz sentir radicalmente nos brevíssimos poemas de Pizarnik: a abertura de espaços em branco, a “aeração da página” (como diz Barthes do haicai), o espaçamento em torno desses poemas sempre reduzidos parece funcionar como materialização, presente, de algo ausente (desaparecido ou inexistente), que os próprios poemas se esforçam por nomear.

 

O que se oferece, aqui, a nós, leitores, nestas primeiras edições brasileiras da poesia de Pizarnik, é, como no poema Em teu aniversário, uma espécie de presente negativo, presente de ausências. Agora nossa solidão não está só.

 

*Texto de apresentação de Os trabalhos e as noites, escrito para a edição da Relicário Edições (2018), por Ana Martins Marques. 


terça-feira, 20 de outubro de 2020

Quarto de despejo: diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus.

 


O livro Quarto de despejo: diário de uma favelada (1960), de Carolina Maria de Jesus (1914-1977), faz 60 anos em 2020. Observadora atenta da realidade nacional, Carolina tinha importantes percepções acerca da sociedade brasileira, especificamente, sobre a cidade de São Paulo, os políticos e a política. A primeira entrada no diário de Carolina data de 15 de julho. A última, de 1 de janeiro de 1960. Como registro da atualidade do seu trabalho, listamos 20 passagens retiradas do seu diário.

As citações (mantivemos a ortografia original) constam da edição de 2014, da editora Ática. Assim, fazemos a referência completa apenas na primeira citação. Nas demais, indicamos somente as páginas. Vejamos o que diz Carolina sobre:

O espaço

1.       “... eu classifico São Paulo assim: O Palácio, é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam lixo”. (JESUS, 2014, p. 32).

2.      : “... Havia pessoas que nos visitava e dizia: - Credo, para viver num lugar assim só os porcos. Isto aqui é o chiqueiro de São Paulo” (p.35)

3.      “... e quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar num quarto de despejo... Estou no quarto de despejo, e o que está no quarto de despejo ou queima-se ou joga-se no lixo” (p. 37).

4.      “Aquelas paisagens há de encantar os olhos dos visitantes de São Paulo, que ignoram que a cidade mais afamada da América do Sul está enferma. Com as suas ulceras. As favelas” (p.85). 

Os políticos

5.      “E falamos de políticos. Quando uma senhora perguntou-me o que acho do Carlos Lacerda, respondi concientemente:

- Muito inteligente. Mas não tem inducação. É um político de cortiço. Um agitador...” (p.15).

6.      “O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no próximo, nas crianças” (p.29).

7.      “E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura – a fome” (p.32).

8.      “Eu quando estou com fome quero matar o Jânio, quero enforcar o Adhemar e queimar o Juscelino. As dificuldades corta o afeto do povo pelos políticos” (p.33).

9.      “... O que o senhor Juscelino tem te aproveitável é a voz. Parece um sabiá e a sua voz é agradável aos ouvidos. E agora, o sabiá está residindo na gaiola de ouro que é o Catete. Cuidado sabiá, para não perder esta gaiola, porque os gatos quando estão com fome contempla as aves nas gaiolas. E os favelados são os gatos. Tem fome” (p.35).

10.  “... Quando um político diz nos seus discursos que está ao lado do povo, que visa incluir-se na política para melhorar nossas condições de vida pedindo o nosso voto prometendo congelar os preços, já está ciente que abordando este grave problema ele vence nas urnas. Depois divorcia-se do povo. Olha o povo com os olhos semi-cerrados. Com um orgulho que fere a nossa sensibilidade” (p.38).

A política

11.  “... A democracia está perdendo os seus adeptos. No nosso paiz tudo está enfraquecendo. O dinheiro é fraco. A democracia é fraca e os políticos fraquíssimos. E tudo que está fraco, morre um dia” (p.39).

12.  “Quem deve dirigir é quem tem capacidade. Quem tem dó e amisade ao povo. Quem governa o nosso país é quem tem dinheiro, quem não sabe o que é fome, a dor, e a aflição do pobre (...). Precisamos livrar o paiz dos políticos açambarcadores” (p.39).

13.  “... De quatro em quatro anos muda-se os políticos e não soluciona a fome, que tem a sua matriz nas favelas e as sucursais nos lares dos operários” (p.40).

14.  “... Mas o povo não está interessado nas eleições, que é o cavalo de Troia que aparece de quatro em quatro anos” (p.43).

15.  “Os políticos só aparece aqui no quarto de despejo, nas épocas eleitorais” (p.45).

16.  “Vi os pobres sair chorando. E as lágrimas dos pobres comove os poetas. Não comove os poetas de salão. Mas os poetas do lixo, os idealistas das favelas, um expectador que assiste e observa as trajédias que os políticos representam em relação ao povo” (p.53).

17.  “O custo de vida faz o operário perder a simpatia pela democracia” (p.112).

18.  “... Quando eu fui almoçar fiquei nervosa porque não tinha mistura. Comecei a ficar nervosa. Vi um jornal com o retrato da deputada Conceição da Costa Neves, rasguei e puis no fogo. Nas epocas eleitoraes ela diz que luta por nós” (p.113).

19.  “O povo não sabe revoltar-se. Deviam ir no Palacio do Ibirapuera e na Assembleia e dar uma surra nestes políticos alinhavados que não sabem administrar o país” (p.129).

20.  “Você já viu um cão quando quer segurar a cauda com a boca e fica rodando sem pegá-la? É igual o governo do Juscelino” (p.134).

Uma das principais obras da literatura brasileira, Quarto de despejo: diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus, constitui-se como leitura necessária não apenas para a compreensão do Brasil dos anos cinquenta, mas para o Brasil que se vê ainda hoje, imerso em contradições e desigualdades sociais extremas. Desta forma, em meio à liquidez do século XXI, a leitura da obra de Carolina Maria de Jesus impõe-se como indispensável e urgente, pois que é um continuado e lancinante grito de alerta e denúncia.

 

 

terça-feira, 10 de março de 2020

DISCURSO SOBRE O COLONIALISMO, POR AIMÉ CÉSAIRE




Aimé Césaire (1913 – 2008) é um dos grandes nomes da poesia em língua francesa. Além da sua produção poética, admirada por autores como  André Breton e Benjamin Péret, também dedicou-se à produção de textos dramatúrgicos. Juntamente com Léopold Sédar Senghor, Césaire foi criador do conceito de “negritude”, o qual perpassa toda sua obra.


Aimé Césaire (1913 - 2008)


Os processos de colonização levados a cabo principalmente pela Europa ocidental, colonizadora e colonialista, constituem-se, antes de qualquer coisa, como movimentos de extrema violência genocida contra os povos que foram vítimas de tais processos. A colonização, conforme Marc Ferro (1924 - ), em A história das colonizações: das conquistas às independências – séculos XIII a XX (1994), é associada à ocupação de uma terra estrangeira, à sua exploração agrícola, à instalação de colonos. Assim definido o termo colônia, o fenômeno data da época grega (...).

Sobre o conceito de colonização, convém observar o que afirmam Silva & Silva em seu Dicionário de conceitos históricos (2015). Dizem:

(...) Colonização, mais que um conceito, é uma categoria histórica, porque diz respeito a diferentes sociedades e momentos ao longo do tempo. A ideia de colonização ultrapassa as fronteiras do Novo Mundo: é um fenômeno de expansão humana pelo planeta, que desenvolve a ocupação e o povoamento de novas regiões. Portanto, colonizar está intimamente associado a cultivar e ocupar uma área nova, instalando nela uma cultura preexistente em outro espaço. Assim sendo, a colonização em determinadas épocas históricas foi realizada sobre espaços vazios, como é o caso das migrações pré-históricas que trouxeram a espécie humana ao continente americano. Mas desde que a humanidade se espalhou pelo mundo, diminuindo significativamente os vazios geográficos, o tipo de colonização mais comum tem sido mesmo aquele  executado sobre áreas já habitadas, como a colonização grega do Mediterrâneo, na Antiguidade, e a colonização do Novo Mundo, na Idade Moderna. (SILVA & SILVA, 2015, P.67)

Assim sendo, o texto de Césaire, traduzido para o português por Anísio Garcez Homem, e publicado pela editora Letras Contemporâneas, mostra-se bastante atualizado, tendo em vista as discussões que têm tomado campo no atual contexto sócio-histórico, político e cultural, quando as potências imperialistas  desumanizam outros povos, com os sórdidos objetivos de lhe saquearem as riquezas e impor sua cultura, destruindo a do outro. O importante para essas potências é dar seguimento ao processo de colonização sob “novas” formas de divisão, dominação e extermínio dos oprimidos, haja vista, o racismo, a xenofobia e o avanço do fascismo.

Césaire (2010, p. 15) inicia seu discurso fazendo as seguintes afirmações: “ Uma civilização que se mostra incapaz de resolver os problemas que suscita seu funcionamento é uma civilização decadente”. E “Uma civilização que escolhe fechar olhos ante seus problemas mais cruciais é uma civilização ferida”. E ainda: “Uma civilização que engana a seus próprios princípios é uma civilização moribunda”. E segue, afirmando que “ o fato é que a civilização chamada “europeia”, a civilização “ocidental”, tal como foi moldada por dois séculos de regime burguês, é incapaz de resolver os dois principais problemas que sua existência originou: o problema do proletariado e o problema colonial. Conforme Césaire: “Esta Europa, citada ante o tribunal da “razão” e ante o tribunal da “consciência”, não pode justificar-se; e se refugia cada vez mais em uma hipocrisia ainda mais odiosas, porque tem cada vez menos probabilidade de enganar”.

Mais adiante, Césaire afirma que:

 (...) a colonização desumaniza o homem mesmo o mais civilizado; que a ação colonial, a empreitada colonial, a conquista colonial, fundada sobre o desprezo do homem nativo e justificada por esse desprezo, tende inevitavelmente a modificar aquele que a empreende; que o colonizador, ao habituar-se a ver no outro a besta, ao exercitar-se em tratá-lo como besta, para acalmar sua consciência, tende objetivamente em transformar-se ele próprio em besta (...). (CÉSAIRE, 2010, p. 29)

Ao longo do seu texto-discurso, Césaire coloca a palavra colonização como sinônimo de coisificação, proletarização e mistificação. Ao contrário daquilo defendido pela Europa colonizadora, os “progressos materiais” resultantes dos seus processos de colonização são ínfimos quando comparado ao rastro de sangue e cheiro de morte deixados pelo caminho. Falar em “progresso material ” sem considerar os danos e as perdas humanas é desleal e criminoso.

Em tempos de retrocesso político, o discurso de Césaire é oportuno para que cada homem e mulher reflita sobre o demônio que lhes habita. Ao fazê-lo, poderá se surpreender ao perceber que o mal não está tão longe quanto nos fazemos acreditar.

Nas palavras do autor:

(...) as formas de atuar de Hitler e do hitlerismo, revelar-lhe ao mui distinto, mui humanista, mui cristão burguês do século XX que leva dentro de si um Hitler e que ignora que Hitler o habita, que Hitler é seu demônio, que, se o vitupera, é por falta de lógica, e que no fundo o que não é perdoável em Hitler não é o crime  contra o homem, não é a humilhação do homem em si, senão o crime contra o homem branco, é a humilhação do homem, e haver aplicado na Europa procedimentos colonialistas que até agora só concerniam aos árabes da Argélia, aos coolies da Índia e aos negros da África. (CÉSAIRE, 2010, p.23).

Assim sendo, no decorrer do seu discurso sobre o colonialismo, Aimé Césaire desconstrói ideias e posicionamentos impostos pelos colonizadores e que reverberam até os dias de hoje, apontando o dedo para feridas que, por questões óbvias, nunca vão sarar.

Boa leitura!

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

O QUE (RE)LER EM 2020



Essa gente

Chico Buarque
Companhia das Letras


Só para maiores de cem anos
Nicanor Parra
Editora 34

Pequeno manual antirracista
Djamila Ribeiro
Companhia das Letras


Jáder de Carvalho e o Nordeste: literatura, jornalismo e região

Fernando Cézar de Macedo
EdUece


Memória, Identidade e Literatura

Daniele Barbosa  Bezerra
Valéria Maria de Oliveira Silva
Francisco Wilton Moreira dos Santos
Expressão Gráfica e Editora


 Necropolítica

Achille Mbembe
N-1 edições

Memória e identidade
Joël Candau
Editora Contexto


Mulas

Luiz Taques
Editora Kan

Versos livres, como nós
Kinaya Black (a.k.a Gisele Sousa)
Editora Letramento


 Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano

Grada Kilomba
Cobogó

A cultura popular sertaneja: literatura, oralidade e experiência em Juvenal Galeno
Manoel Carlos Fonseca de Alencar
Appris editora

Pavilhão Sete: presos políticos da ditadura civil-militar
Airton de Farias
Expressão Gráfica e Editora

Eu, Tituba: bruxa negra de Salem
Maryse Condé
Rosa dos tempos

Escravidão: do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares
Laurentino Gomes
Globo Livros

O silêncio das coisas: Herbert Rolim
Ana Cecília e Júnior Pimenta (Orgs.)
Editora Reticências

Enfim, capivaras
Luisa Geisler
Editora Seguinte

A origem dos outros
Toni Morrison
Companhia das Letras

Uma morte horrível
Pénelope Bagieu
Nemo

Rugas
Paco Roca
Devir Livraria

O perigo de uma história única
Chimamanda Ngozi Adichie
Companhia das Letras

Ninguém nasce herói
Eric Novello
Editora Seguinte

Suicidas
Rapahel Montes
Companhia das Letras

Circe
Madeline Miller
Editora Planeta

Fascismo Eterno
Umberto Eco

Editora Record

Fascismo: um alerta
Madeleine Albright

Editora Crítica