domingo, 10 de agosto de 2014

TOPOFILIA


O Planeta Terra, devido em grande parte à ganância do ser humano, agoniza a olhos vistos. Pouco tem sido feito para evitarmos que o nosso habitat entre em colapso. Caso isso ocorra, a humanidade perecerá; mas séculos e séculos depois o planeta se recomporá, voltando a ser o que fora na sua origem. Embora muito esteja sendo dito, quase nada tem sido efetivamente feito para combatermos a proximidade do fim. E assim sendo, o homem continua cavando em tudo quanto é lugar, em busca de petróleo para enchermos nossos tanques e pormos nossas usinas em funcionamento. Nada tem escapado à ambição cega desse homem que, mesmo contemporâneo, age como se um primata fosse.

Alguns autores apresentam constantes contribuições, em tentativas de levar o ser humano a compreender suas relações como seu meio ambiente. Esses objetivos nem sempre são
Yi-Fu Tuan
alcançados, uma vez que geralmente nem temos tido tempo para percebermos o quão longe estamos dos nossos semelhantes. E aqui me vem uma máxima de Saramago, quando diz que chegamos muito mais rapidamente a Marte do que ao nosso próprio semelhante. Na linha daqueles que demostram preocupações com o mundo tal qual o conhecemos, atentamos para os estudos propostos pelo professor Yi-Fu Tuan, "Prêmio Nobel da Geografia", de 2012 (trata-se, na verdade, do Prêmio Vautrin Lud). A obra do professor Tuan nos tem obrigado a perceber o pensamento geográfico humanista na medida em que proporciona estudos mais amplos e conscientizadores acerca da percepção do ambiente. 

Embora seja um homem da Geografia, seus trabalhos não se limitam a essa ou aquela questão em específico. Sua obra aponta para um pensar amplo e irrestrito, aproximando a geografia de inúmeras outras áreas do conhecimento. Entres seus vários trabalhos, o Professor Emérito da Universidade de Winsconsin-Madison (EUA), publicou Espaço e lugar: a perspectiva da experiência (1983) e Paisagens do medo (2005). O primeiro foi publicado, no Brasil, pela editora Difel, enquanto o segundo foi publicado pela Editora da UNESP. Antes desses, no entanto, o professor Tuan publicou Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. A obra em questão foi publicada pela primeira vez em 1974. No Brasil, pela EDUEL, no ano de 2012. Excetuando-se alguns problemas, mais de impressão do que de tradução (a tradução é de Lívia de Oliveira), trata-se de uma publicação das mais relevantes sobre a temática da relação homem/meio.

No diz respeito à estrutura da obra, além dos agradecimentos e do prefácio, o livro traz uma divisão em capítulos. Quinze ao todo. O último denomina-se “Resumo e conclusões” e não traz as referências bibliográficas.  Ao longo dos catorze capítulos principais, o autor traça um amplo painel das relações estabelecidas entre o ser humano e o meio ambiente, relações essas quase sempre violadas pelo homem. Consideramos amplo o painel proposto
pelo professor Tuan, uma vez que o referido autor abarca desde a percepção que o homem tem dos próprios sentidos, passando pelas questões psicológicas, bem como acerca de considerações sobre o etnocentrismo, a simetria do espaço, subúrbios, cidades, meio ambiente e cosmo. Na introdução ao seu trabalho, Yi-Fu Tuan discorre sobre como estão organizados os capítulos, descrevendo e explicitando o que trata cada um deles. Na ocasião, o professor faz uma definição daquilo que deva ser compreendido como Topofilia. Diz: “Topofilia é o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou ambiente físico. Difuso como conceito, vivido e concreto como experiência pessoal...”.

Em breve apresentação, na orelha esquerda do livro, Lúcia Helena Batista Gratão (2012), da Universidade Estadual de Londrina, afirma:


Do amor ao sentimento de Topofilia. Esse é o princípio fundante da obra que o geógrafo Yi-Fu Tuan compôs para explorar as ligações afetivas dos seres humanos com o meio ambiente. Que belo neologismo de uma palavra para compreender os laços que se (entre)laçam entre meio ambiente e visão do mundo! Nos (entre)meios e (entre)laços, os sentimentos topofílicos se revelam de maneira profundamente diferente em intensidade, sutileza e modo de expressão. Do efêmero prazer que se tem de uma vista, até a sensação de beleza, igualmente fugaz, mas muito mais intensa. Das sensações de deleite ao sentir o ar, a água, a terra no contato físico. (GRATÃO, 2012)

E continua ela:

Mais permanentes e mais difíceis de expressar, são os sentimentos que temos para com um lugar, por ser o lar, o locus de reminiscências e o meio de se ganhar a vida. Em qualquer lugar onde haja seres humanos, haverá o lar de alguém – como todo o significado afetivo da palavra. A Topofilia é um sentimento de que a Terra é um relicário de lembranças e (res)guarda a esperança. Sentimento expresso de que a Terra é uma obra de apreciação estética e, ao mesmo tempo, substractum da vida, parte do ser, lugar da vida. Tudo isso que contém a palavra Topofilia por toda a beleza de ver e de estar no mundo. Terra nosso lar. (GRATÃO, 2012)




Da primeira publicação de Topofilia (1974) ao momento em que escrevo essa resenha (2014), lá se vão quarenta anos; o que nos faz questionar a razão pela qual as palavras do professor Tuan continuam a reverberar em nossos sentidos. Uma resposta possível talvez esteja calcada na força que essas palavras trazem em si. São palavras que, ao mesmo tempo em que nos escancaram a beleza do planeta em que vivemos, também nos alertam para a responsabilidade que temos sobre esse mesmo planeta enquanto morada de todos. No entanto, serão as urgentes mudanças na relação homem/Terra que decidirão como  será o futuro que nos aguarda.

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