Muitas são as histórias de amor que lemos, vivemos ou ouvimos falar. Cada uma dessas histórias tem suas peculiaridades e trazem em si as alegrias e as dores dos envolvidos. Se perguntados se fariam tudo de novo, provavelmente os amantes diriam que sim, pois nem sempre são eles os donos dos seus destinos, mas o Amor.
A literatura universal
está repleta de casais que, fictícios ou não, viveram grandes paixões. Convém
inclusive indagar, o que seria da vida sem uma grande paixão, um grande amor
para ser vivido. Às vezes, grandes amores se tornam grandes obras, mas nenhuma
grande obra jamais valerá mais que um grande amor. É claro que nos encanta o
amor de Fernando e Isaura, Tristão e Isolda, Heloísa e Abelardo, Isabeau
e Navarre ou Romeu e Julieta; entre tantos outros. O curioso é, muitas vezes,
não nos darmos conta daqueles grandes amores que acontecem bem diante dos
nossos olhos e que nem sempre percebemos.
Uma linda (e triste) história
de amor nos é contada pela escritora Adriana Falcão no seu mais recente
trabalho intitulado Queria ver você feliz,
publicado pela editora Intrínseca, no ano de 2014. Trata-se da história de amor
vivida por Caio e Maria Augusta, pais da autora. A narrativa de Falcão é costurada pelas cartas trocadas pelo casal desde que se conheceram na juventude
até boa parte da vida de casados. Chama-nos atenção a boa qualidade da edição do livro que, além das cartas reproduzidas em
cor de destaque, também traz fotografias do acervo pessoal da família da autora,
o que enriquece em muito a obra.
Adriana Falcão é
escritora, cronista e roteirista, nome conhecido por trabalhos na televisão e
no cinema. Queria ver você feliz é
sua primeira incursão pela literatura de não ficção, o que faz com destacada
mestria. A maneira escolhida pela autora para contar a história de amor, vida e
morte dos seus pais é inovadora, uma vez que ela deu ao próprio Amor a função
de narrar os fatos. É claro que aqui e ali o narrador se empolga e desanda a
falar dele mesmo; não tarda e eis que ele retoma o fio da narrativa. E se a história de Caio e Maria Augusta
ganhou o mundo, a culpa (se é que há culpa) é do Amor, em conluio com quem
teria aberto “um certo baú florido onde estavam guardados cartões, bilhetes,
retratos e cartas”. Mas ainda bem que alguém se dignou abrir o tal do baú, pois
a história de Maria Augusta e Caio não poderia ficar eternamente encerrada em
um baú; mesmo que florido. O amor de Maria Augusta e Caio precisava ser registrado
e amplamente divulgado, para ser lido com o mesmo fervor com o qual lemos sobre
Guinevere e Lancelot, por exemplo.
A narrativa de Adriana
Falcão faz com que o leitor sinta cada mudança ocorrida na relação das
personagens principais, desde seus mais tenros encontros aos momentos mais
difíceis que tiveram que enfrentar (sempre juntos) ao longo da vida. O texto de
Falcão não deve ter sido muito fácil de ser construído, tendo em vista ela também
ser personagem em uma história palmilhada
por recorrentes picos de alegrias, perdas, tristezas e dores. Às vezes, no
entanto, o escritor precisar se afastar do fato para poder ver de fora e contar
da melhor maneira possível aquilo que ele achava que já estava pronto e
imutável. Além de uma possível catarse, o
registro publicado por Falcão deve tê-la aproximado cada vez mais dos próprios
pais e da própria família. Caio e Maria Augusta eram dois. Tornaram-se apenas um, para depois restar
apenas um sozinho, para depois restar apenas os registros e as memórias.
Queria
ver você feliz é uma das melhores narrativas de não
ficção publicadas nos últimos anos. Advirto-o, caro leitor, que não se trata de
uma história leve. Embora o narrador, o Amor, use de toda sua poesia e bom
humor na condução da narrativa, ele não consegue fazer com que o leitor não receba
sua carga de dor. E se, ao final da leitura, você se sentir pesado, triste,
cansado e com a impressão de que gostaria que as coisas tivessem sido
diferentes para Caio e Maria Augusta; não ache estranho, pois você realmente estará
se sentindo assim. Não entenda isso como
um problema, nem como um obstáculo para a leitura do livro, mas como uma
maneira de compreender que a narrativa foi escrita com sangue e pulso, como
devem ser escritas as grandes narrativas. A depressão, a síndrome de bordeline, comprimidos e álcool podem
até matar corpos; mas jamais terão o poder de extinguir um grande amor. E o Amor, mais do que ninguém, sabe muito bem disso,
pois: “the cigarettes you light / One after another / Won’t help you forget her / And
the way that you love her”.
O que todos queremos, na maioria das vezes,
é apenas ver felizes aqueles a quem amamos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário