segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Só para maiores de cem anos, de Nicanor Parra

 

Publicado pela editora 34, com seleção e tradução de Joana Barossi e Cide Piquet, a antologia bilingue de Só para maiores de cem anos: antologia anti(poética) (2018) é a oportunidade para que o leitor brasileiro tenha uma visão geral da poesia e da antipoesia de Nicanor Parra (1914-2018), considerado um dos maiores poetas do nosso tempo.


A antologia é composta de poemas selecionados de livros do autor, que vão de 1954 até 1985. Trata-se de uma belíssima seleção organizada da seguinte maneira: De Poemas e antipoemas (1954), 13 poemas, Versos de Salão (1962), 18. Tem-se o poema “Manifesto”, de 1963, De Canções russas (1967), 12 poemas, de Obra grossa (1969), 20 poemas, de Emergency poems (1972), 05, de Folhas de Parra (1985), 06 poemas. Ao todo, Só para maiores de cem anos traz setenta e cinco poemas. A edição traz ainda um posfácio escrito por Joana Barossi.

Nicanor Parra é o principal nome da chamada antipoesia, a qual se constitui como uma poesia de ruptura, que tem na essência da sua construção determinados elementos linguísticos e culturais identificados com as classes populares. Ao optar por esse tipo de informalidade poética, Parra afastou-se da forma tradicional de se fazer poesia, isolando-se como referência entre seus pares.

Um aspecto central da produção de Parra, plenamente realizado na antipoesia, afirmam os tradutores da obra, “passa pela inversão crítica das expectativas associadas ao discurso poético elevado: “Os poetas baixaram do Olimpo”, diz um de seus poemas mais famosos, “Manifesto”. Contra o poeta demiurgo, o poeta mortal e ordinário; contra o poeta de salão, o poeta das ruas; contra o poeta cheio de si, o poeta que ri de si mesmo; contra a poesia da lua, da donzela e das flores, a poesia da tumba, do espirro e do sangue de nariz. Tal inversão se dá pela recusa dos lugares-comuns da poesia lírica e da linguagem afetada, hermética ou livresca; em seu lugar, o poeta utiliza a linguagem coloquial, a expressão natural, a língua falada no dia a dia, ainda que não linear e atravessada por outros registros, como por exemplo o do discurso religioso (via de regra com fins satíricos)  ou de extração surrealista, outra marca do autor, sempre interessado em surpreender, confundir e até importunar o leitor, tirando-o da posição confortável e passiva” (p.10-11).

Nicanor Parra

Eis a poesia de Nicanor Parra, caro leitor, um poeta que conseguia construir versos como este sobre o mar: “Este, menino, é o mar”. “Frente ao enorme senhor das batalhas” (p.25). E este, que provoca o leitor, quando diz que: “Já que as árvores são apenas móveis que se agitam/não mais que cadeiras e mesas em movimento perpétuo” (p.37); ou ainda este, de 1957, mas bastante atual: “A polícia mata por matar” (p.81).  A antipoesia de Parra não o impediu, é claro, de produzir grandes poemas líricos. No livro em questão, não se pode passar ao largo, por exemplo, do poema “Defesa de Violeta Parra” (p. 133-138), quando diz: “Que te custa mulher árvore florida/Ergue-te de corpo e alma do sepulcro/E faz estalar as pedras com tua voz/Violeta Parra”.

Só para maiores de cem anos: antologia (anti)poética, de Nicanor Parra, é leitura indicada, na verdade, para todas as idades. Leiamos!

 

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário