segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

COLAR DE PEDRAS FALSAS, DE FRANCISCO CARVALHO

Francisco Carvalho (1927-2013) é daqueles poetas que se inserem na amplitude da literatura produzida em língua portuguesa, tendo em vista a extensão e a qualidade da sua obra poética. Autor de mais de trinta livros, Carvalho soube como poucos cultivar a palavra, moldando-a a seu bel prazer. Como produzia muito, é bem possível que ainda surjam trabalhos inéditos do autor de Centauros urbanos (2003), o que em muito agradaria seus leitores e pesquisadores.

De todos os seus trabalhos, há um que é pouco conhecido, mas que nem por isso pode ser considerado menor. Trata-se do livro Colar de pedras falsas (2005), publicado pela editora Guararapes – EGM, de Jaboatão, Pernambuco. Durante as nossas pesquisas, não conseguimos localizar o livro no seu formato tradicional, se é que ele existe nesse formato. Explico: a versão que temos desse livro é uma espécie de “edição artesanal”,  de aproximadamente 6cm, tendo seus paratextos sido montados manualmente.




O corpo do livro é composto de um poema longo de 155 estrofes, impressas em uma folha de papel, respeitando o tamanho de 6cm. Cada página corresponde a uma dobradura dessa folha única. O poema se inicia com a estrofe que diz: “A leveza dos abutres / faz lembrar certos rodeios / de alguns próceres ilustres” e se conclui com: “ As cabras vão embora / fica na relva o perfume dos seios da pastora”. Registre-se que o referido trabalho não é mencionado em nenhuma das fontes que trazem a lista de obras do poeta. A única referência que conseguimos localizar diz respeito ao poema escrito por Horácio Dídimo, constante dos arquivos da Academia Cearense de Letras – ACL. Ei-lo:


Colar de pedras falsas  
                        Para Francisco Carvalho
                          Horácio Dídimo
                          Exercícios de admiração

Caro Francisco Carvalho,
Cordialmente agradeço
E confirmo o meu apreço
Por esse belo trabalho.

A poesia que produz
Tão primoroso adereço
Traz sempre um novo começo,
Nova cor e nova luz

Ao reler a sua obra
Acrescento este capítulo
Onde nada falta ou sobra:

As palavras são certeiras,
É falso apenas o título,

As pedras são verdadeiras. 

domingo, 11 de fevereiro de 2018

CEGO ADERALDO: O HOMEM, O POETA E O MITO, DE ROSEMBERG CARIRY

Cego Aderaldo é homem do Crato, interior do Ceará. Nasceu no dia 24 de junho de 1878, na Rua da Pedra Lavrada, também conhecida como  Rua da Vala. Filho de Joaquim Rufino de Araújo e Maria Olímpia de Araújo. Sua história é feita de tristezas, perdas e alegrias, como são tecidas as histórias de todos os viventes. Os muitos detalhes da sua existência foram contados pelo próprio Aderaldo ao amigo Eduardo Campos que, durante mais de seis meses registrou as informações que lhe eram ditas, assim como os versos que o velho Cego lhe soprava. Isso lá pelos idos de 1962, quando escreviam  o livro Eu sou o Cego Aderaldo, publicado no ano de 1994, pela editora Maltese, com apresentação de Rachel de Queiroz.

Cego Aderaldo alcançou o reconhecimento em vida, tendo se tornado uma lenda da cantoria nordestina, muitas vezes comparado a Homero ou Tirésias. Ao ser privado da visão, Cego Aderaldo tornou-se voz e fez-se referência e exemplo no imaginário nordestino. Não passou muito tempo após a sua morte, para que o homem e  poeta Cego Aderaldo também se tornasse o mito Cego Aderaldo. É essa história com a riqueza de detalhes que uma boa pesquisa exige que é publicada agora pela editora Interarte, de Fortaleza, com o apoio institucional do Instituto Dragão do Mar, SECULT e Governo do Estado do Ceará. Trata-se de um trabalho de fôlego organizado pelo cineasta e poeta Rosemberg Cariry.
Rosemberg Cariry

Ricamente ilustrado e abundante em fontes de pesquisa, a obra em questão recebeu o nome de Cego Aderaldo – O homem, o poeta e o mito (2017). Na ficha catalográfica, no entanto, a obra está registrada como Cego Aderaldo: o homem, o cantador e o mito, o que nos remete ao filme de Cariry com o mesmo nome. O livro está organizado em três partes, a saber: a primeira parte é denominada de “o homem e o mito” e está subdividida em Ato I (p. 39 – 118), Ato II (p. 119 – 380) e Ato III (p. 381 – 644).  A segunda parte não recebeu denominação. É composta das notas do organizador e obra de Cego Aderaldo (p. 647 – 760). A terceira e última parte está dedicada à cronologia e à bibliografia consultada (p. 763 – 779).

Ao organizar um livro sobre a vida e a obra de Cego Aderaldo, Cariry não apenas presta merecida homenagem ao grande mestre da cantoria nordestina, como contribui de forma inquestionável para a manutenção do reconhecimento cultural das artes que são produzidas no âmbito dos homens e mulheres do povo. Dessa forma, o livro de Rosemberg Cariry, além de manter acesas as luzes  sobre a obra de Aderaldo, também abre caminho para que as novas gerações tenham a oportunidade de vivenciar a riqueza da sua poética. Se farão bom uso de tudo que ali está dito, aí já não se sabe. Os dados estão lançados. As obras, de Aderaldo e de Cariry, estão circulando por aí. Resta-nos descobrir pra que lado é o nascente e seguir, seguir sempre.

Casa de Saberes Cego Aderaldo - Quixadá, Ceará

Em tempo:
Um ano após seu nascimento, Aderaldo, que só ficaria cego aos dezoito anos de idade, no ano de 1896, se estabelece com sua família na cidade de Quixadá, no sertão central do Ceará. Hoje, em sua homenagem, a cidade de Quixadá mantém a Casa de Saberes Cego Aderaldo.

Filme: Cego Aderaldo – o cantador e  o mito, de Rosemberg Cariry, mais informações http://www.imdb.com/title/tt2356076/

Sobre a Casa de Saberes Cego Aderaldo > http://mapa.cultura.ce.gov.br/espaco/891/