Ainda sem tradução para o
português brasileiro Teaching my mother
how to give birth (2011), de Warsan Shire, é uma das melhores produções
poéticas dos últimos anos. Em tradução livre seria algo como “Ensinando minha
mãe a dar a luz”. No caso da poesia desenvolvida por Shire, “dar a luz”
implica não em ter um filho, em parir; mas abrir a cabeça e o coração para
compreender coisas que foram negadas à seguidas gerações de mulheres.
Teaching my mother how to
give birth foi publicado no Reino Unido pela Flipped Eye Publishing, contendo
vinte e um poemas. A frase que abre o livro é: “I have my mother’s mouth and my
father’s eyes; on my face they are still together” (Tenho a boca da minha mãe e
os olhos do meu pai, no meu rosto eles continuam juntos).
A frase que inicia o
trabalho também se constitui como uma das principais temáticas que perpassam
toda a obra. Originários da Somália, os pais da poetisa acabam por se tornarem
uma representação de todo o povo somali na poesia de Shire. Embora tenha sido criada na Inglaterra, Warsan Shire optou por trabalhar temáticas poéticas que,
de uma forma ou de outra, estivessem ligadas aos seus parentes e amigos que
ficaram na Somália.
Nesse sentido, percebe-se
na sua poesia um compromisso em denunciar o resultado traumático que se abateu
sobre seu povo, quando do final da guerra civil que brutalizou seu país. Em consequência,
se deu a diáspora, com impacto devastador, principalmente sobre as
mulheres. Por meio de seus versos, Warsan Shire consegue apontar o dedo para as
contradições, os conflitos, os ditos e os não ditos da experiência diaspórica. Nesse
contexto, Shire aborda assuntos como o amor, a diáspora, a ausência do homem na
família, a violência sexual contra a mulher e os refugiados somalis, bem como as relações entre mães e filhas.
Warsan Shire é uma
daquela poetas que escreve não apenas a partir daquilo que sente ou vive, mas
também das experiências de todos aqueles que a circundam. Nas suas próprias
palavras: “... eu sou cada uma das pessoas sobre as quais escrevo...”. Em termos gerais, a poesia de Warsan Shire
pretende ser a voz daqueles que não são ouvidos, ou seja, os imigrantes,
refugiados e outros grupos marginalizados.
Shire recorre à sua
poesia como forma de se manter em conexão com sua terra natal, a Somália, onde,
na verdade, ela nunca esteve. Para tanto, utiliza sua própria posição de
imigrante. Dessa maneira, todos, parentes e amigos, acabam por se constituírem como
matéria-prima da sua poesia.
Os poemas que compõem Teaching my mother how to give birth
são: “What your mother told you after your father left”, “Your mother’s first
kiss”, “Things we had lost in the summer”, “Maymuun’s mouth”, “Grandfather’s
hands”, “Bone”, “Snow”, “Birds”, “Beauty”, “The kitchen”, “Fire”, “When we last
saw your father”, “You were conceived”, “Trying to swim with God”, “Questions
for Miriam”, “Conversations about home”, “Old spice”, “My foreign wife is dying
and does not want to be touched”, “Ugly”, “Tea with our grandmothers” and “In
love and in war”.
A poesia de Warsan Shire dialoga com a poesia de Rupi Kaur, assim como com a canção de
Beyoncé, a qual declama alguns de seus poemas no seu álbum visual “Lemonade”. Warsan
Shire, no entanto, não faz alarde, nem se deixa dominar pela vaidade, pois sua
poesia é feita de silêncios. Silêncios que gritam e dilaceram os ouvidos daqueles que a leem.