Houve um tempo em que conseguir um livro de um autor estrangeiro, no Brasil, demandava tempo e paciência. Na melhor das hipóteses, ficava-se esperando que um conhecido viajasse para que se pudesse encomendar, entre outras coisas, livros. As coisas,pelo menos algumas delas, mudaram. Assim, hoje já é possível ler autores estrangeiros, traduzidos ou no original, com uma simples ida a livraria mais próxima ou encomendá-los via internet e aguardá-los em casa. Penso nisso enquanto leio Poemas (2011), da escritora polonesa Wislawa Szymborska (pronuncia-se algo como Vissuáva Chembórska).
Wislawa Szymborska |
Conforme o prefácio de Regina Przybycien, a referida autora nasceu no ano de 1923, no vilarejo de Bnin, hoje parte de Kórnik, uma pequena cidade próxima a Poznán. Em 1931, continua Przybycien, a família mudou-se para Cracóvia, onde a poeta vive desde então. de 1945 a 1948, estudou literatura e sociologia na Universidade Iaguielônica de Cracóvia, mas não chegou a se formar. Casou-se em 1948 com o poeta Adam Wlodek, de quem se divorciou em 1953. Ainda conforme o prefácio de Regina Przybycien, não se sabe muito sobre a vida privada da poeta, uma vez que ela não se coloca no papel de celebridade literária, dessas que aparecem na televisão e opinam sobre os mais diversos assuntos. Também não gosta de dar entrevistas. Uma vez declarou: "Minha vida está nos meus versos". E é dessa autora, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 1996, que a Companhia das Letras publicou em 2011 a obra Poemas com seleção, tradução e prefácio da professora Regina Przybycien e orelhas de Nelson Ascher.
Sobre a autora e sua obra, Nelson Ascher afirma:
(...) a polonesa Wislawa Szymborska sempre escreveu pouco. Beirando os noventa anos, toda sua produção, que cabe num volume relativamente pequeno, pode ser lida em um dia ou dois, mas requer tempo para ser de fato apreciada. E isso não porque ela "escreva difícil", pois, para os poetas poloneses nascidos no entreguerras, quando seu país ressurgiu da ruína de três impérios, não havia crime maior que o hermetismo, a obscuridade. Pelo contrário, seus versos,que, lúcidos e acessíveis, nunca recorrem a referências esotéricas e a passes verbais de mágica, desdobram-se quase como equações lógicas cuja argumentação pode ser acompanhada por qualquer um.Nem por isso se trata de uma poesia fácil, no sentido de feita com facilidade. Sua arte, que é a da contenção, da economia e da reticência, pressupõe, em cada poema, uma intencionalidade meticulosamente pensada e, portanto, uma prolongada gestação. A polonesa só escreve seus poemas necessários e os escreve apenas uma vez, vale dizer, ela inventa procedimentos novos para cada um deles e não os repete nem os converte, como fazem bardos menores, em matriz xerográfica de dúzias de poemas similares. (ASCHER:2011)
E continua o crítico:
Foi em polonês que se escreveu a melhor poesia dos últimos cinquenta ou sessenta anos, e, pelas mãos de Szymborska, a geração de poetas que testemunhou a Segunda Guerra e o Holocausto, a ocupação nazista e a tirania comunista mostrou como a sanidade e a lucidez podem brotar da terra arrasada. (ASCHER: 2011)
Comprometida em produzir uma obra que privilegie a qualidade, em quase seis décadas de poesia, a autora publicou muito pouco, Sua obra pode ser resumida a não mais que uma centena de poemas, constituindo até então uns doze pequenos volumes. São eles: Por isso vivemos (1952), Perguntas feitas a mim mesma (1954); Chamando por Yeti (1957); Sal (1962); Muito divertido (1967); Todo caso (1972); Um grande número (1976); Gente na ponte (1987); Fim e começo (1993); Instante (2002); Dois pontos (2005) e Aqui (2009).
A edição sobre da qual tratamos aqui, contempla poemas das obras de 1957, 1962, 1967, 1972, 1976, 1987, 1993 e 2002. A primeira parte da obra está em português e a segunda traz poemas originais em polonês. Todas as traduções referidas aqui são de autoria da professora Regina Przybycien.
A boa poesia não carece ser explicitada por meio de termos complexos, herméticos. Ao contrário, é a utilização do simples que pode fazer com que uma poesia diga tudo aquilo que deve ser dito sem que seja eruditamente prepotente. Sabedora da vida e conhecedora dos meandros do fazer poético, Szymborska concatena simplicidade e leveza na construção da sua poesia. Citado por Przybycien, Malgorzata Baranowska define o senso de humor da poeta como "uma combinação de um paradoxo filosófico muito refinado com uma linguagem extremamente simples, cheia de expressões do cotidiano. Seria esse então o segredo do sucesso da poesia de Szymborska? Mas, tendo em vista as questões políticas polonesas, onde estaria na poesia dessa autora seu estar-no-mundo?
Como dito, a poesia da autora polonesa é marcada pela simplicidade do cotidiano. Contudo, não se trata de uma poesia panfletária. E assim sendo, do seu locus a poeta vê sua aldeia, mas também vê o mundo; abordando a política e a situação da mulher na contemporaneidade. Dessa forma, o simples e complexo se entrelaçam na denuncia que a poeta faz da opressão, da tortura, da utopia, da pornografia... do nosso tempo. Poemas, Wislawa Szymborska é leitura obrigatória para todos aqueles que anseiam pela simplicidade de grandes poemas.
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