terça-feira, 31 de julho de 2018

DE 1 TUDO, DE DERIBALDO SANTOS


A expressão “de um tudo” é bastante conhecida do povo brasileiro, significando a variedade e a miscelânea de coisas que conseguimos unir, independentemente, do local e da circunstância. Assim sendo, misturamos cores, frutas, estilos musicais, açaí com tapioca, chiclete com banana. Também misturamos escritas, leituras e literaturas. Essas misturas, guardadas as devidas proporções, das quais já nos falava Gilberto Freyre, nos encaminharam uma realidade cultural antropofágica que fincou suas raízes na cultura brasileira, como um todo, bem como na literatura, de maneira mais específica.

Dessa forma, a literatura brasileira acabou por assumir características que lhe são bastante peculiares, tornando-se assim, uma das mais bem elaboradas do mundo. Contudo, se nossa literatura ainda não se fez conhecer em outras paragens, deve ser devido ao descaso dos nossos sucessivos governantes, que insistem na manutenção do nosso eterno complexo de arlequim  de província, mergulhado numa subalternidade que nunca teve motivo de ser.

Mas nossos escritores saem para ver o mundo e, voltando, nos contam daquilo que viram, daquilo que os impactaram. Para tanto, alguns optam pelo romance, outras pelas narrativas breves, as imagens, o corpo, a cena. E de repente, aquilo que tanto nos pode parecer distante e alheio aos nossos olhos se transmuta em algo que nos é próximo, quase íntimo. E assim, percebemo-nos parte de um todo em consonância com o mundo, com o outro, com o de um tudo.

Foi provavelmente imbuído desse sentido, que o escritor Deribaldo Santos conseguiu capturar, por meio do seu texto, as inúmeras partes constituintes do ser humano, não importando onde esse ser humano vá, onde quer que ele esteja. Destarte, algumas das observações de Santos resultaram no livro intitulado De 1 tudo (2018), publicado pela editora Corsário. Trata-se de um livro que tem “de um tudo”, ou quase: metade do livro (12 textos, que vão da p.7 até a p. 49) são relatos de uma viagem que o autor fez ao Velho Mundo. E embora algumas vezes o autor trate seu texto como se um diário fosse, na verdade não o é, podendo ser melhor classificado como  “relatos de viagem” ou “crônicas de viagem”. Há, na verdade, uma mistura de gênero no texto que nos apresenta o autor. Daí o título do livro cair como uma luva para as narrativas que se apresentam. 

O título em si, por sua vez, já é um verdadeiro poema concreto: De 1 tudo. A segunda parte do livro, denominada de “O vento mudou...” (que vai da p.51 até a p. 85) é composta por sete textos. Nesse caso, reconhecemos esses textos como crônicas, uma vez que abordam o cotidiano, o tempo, assim como as observações do narrador a respeito do ambiente que o circunda.  Seja qual for a terminologia que possa ser usada para classificar os textos de Deribaldo Santos, em nada alteram a concepção poético-narrativa da sua obra, eivada de um humanismo simples e leve, que apenas os olhos maduros de um bom observador são capazes de colher.
Deribaldo Santos

O início do livro registra latitude e longitude 40º 24’ N/ 3º 42’ 2’’ W (p. 7). Ao nos encaminharmos para o seu final, somo avisados que o vento mudou, e tem-se, agora, latitude e longitude 03º 43’ 02’’ S/38º 32’ 35’’ W (os entendedores entenderão!). o livro é ilustrado com fotografias do autor, parentes e amigos. Ao final De 1 tudo, tem-se o texto “Ode à leitura: prefácios, posfácios, fortuna crítica: distúrbios ou devaneios” (p. 86-877), do poeta-editor Mardônio França. Lá, França discorre sobre o trabalho de Deribaldo Santos, dizendo que “ A literatura é feita por pessoas, sejam incríveis ou menores no ato de fazer o pão de cada dia”.

A abertura possibilitada pela narrativa de Deribaldo Santos a aproxima da literatura que tem sido produzida no país, permitindo ao leitor variadas interpretações. Trata-se de um texto que oscila entre o erudito e o popular, aproximando-se, por vezes, das narrativas dos cronistas de viagem, da poesia em prosa de base alencarina, bem como da narrativa do safado (sincero?) Bukowski. 


De leitura indispensável, De 1 tudo está rodando por aí, e o alcançará, caro leitor, não importando os braços e abraços das latitudes e  longitudes que te abrigam. Boa leitura!


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