E eis que leio no site da Universidade
Estadual do Ceará (www.uece.br),
que até o ano de 2030, conforme informação divulgada pela UNESCO, no dia
mundial do professor, 05 de outubro, serão necessários cinco milhões de
professores no mundo todo. A urgente contratação desses profissionais tenta,
entre outros objetivos, fazer com que milhões de crianças tenham acesso à
educação básica. A falta de professores, continua o comunicado, é mais evidente
no continente africano e em países árabes. E mesmo que tal meta seja alcançada,
mesmo assim um número absurdo de crianças nunca terá acesso à educação. Segundo
as Nações Unidas, dos 57 milhões de crianças que não frequentam a escola,
metade são meninas.
No que diz respeito aos professores, o
comunicado das Nações Unidas afirma que “os professores são a solução para a
crise da aprendizagem, mas muitos são mal treinados, mal apoiados e excluídos
das questões sobre políticas educacionais e das decisões que os interessam e os
afetam”. E eu, cá com meus botões e minha chávena de chá de hortelã, me
pergunto por qual razão somente agora essas questões estão sendo postas na mesa.
E a resposta é por demais “simples”. Para o enviado especial da ONU para a
Educação Global, Gordon Brown, os países estão verificando que não serão bem
sucedidos se não investirem na educação. Obviamente, você nem precisa assumir
tão importante cargo para saber que isso é um fato. Se os governantes ouvissem
seus povos, isso não teria chegado a esse patamar desesperador e que,
certamente, entrará em colapso. Em países como o Brasil, por exemplo, todas as
vezes que os professores se unem e marcham por melhores condições de salários e
melhorias na educação, são espancados pela polícia, ridicularizados, humilhados e ignorados pelos governantes. A impressão
que se tem é que esses profissionais são um fardo para o Estado. Já passei dos
quarenta e tenho visto isso na mídia brasileira desde que era um garoto. A
preocupação das autoridades para com a educação limita-se a uma retórica que
não encanta mais nem a mais estúpida das serpentes.
E dando continuidade ao seu discurso
sobre a descoberta da pólvora, o senhor Brown disse: “educação não é a única
maneira de fortalecer as oportunidades pessoais. Não é a única maneira de
quebrar o ciclo da pobreza. Mas é uma forma de as nações se tornarem mais
prósperas”. E disse mais: “a menos que consigamos contratar mais professores,
teremos gerações de pessoas desempregadas e que não serão empregáveis”. As
paradoxais declarações do representante das Nações Unidas apontam para um
discurso recheado de “mais do mesmo”, quando não aponta, por exemplo, quais
seriam as outras maneiras de fortalecer as oportunidades pessoais, por exemplo,
ou quando usa os verbos ter e ser, no tempo futuro, quando em países
como o Brasil, por exemplo, já se observa uma imensa massa de jovens
desempregados e não empregáveis. A violência e a barbárie cotidianas são
resultados do recorrente descaso com a educação e do contínuo desgaste dos
professores.
Para que até o ano de 2030 nossas
crianças e jovens possam contar com cinco milhões de professores, muita água
ainda precisa correr debaixo da ponte. Isso se ainda houver água em 2030. Quem,
tendo em vista as péssimas condições de trabalho, o ofensivo salário pago e o
recorrente desrespeito pelo qual se passa, optará pelo magistério? 2030 já está
quase batendo à porta do mundo e são irrisórias as propostas apresentadas, bem
como as ações implementadas pelos governos em relação à educação. “Os
professores são tão explorados e desrespeitados que qualquer pessoa que escolha
essa profissão hoje deve ter sua inteligência questionada e, portanto, não
poderia nem mesmo ser autorizada a ensinar”. Embora rude, o comentário anterior
é de uma sobriedade e tanto, se considerarmos a situação dos professores mundo
afora. Se para uns ele poderia ser destruidor, para o professor Taylor Mali,
foi instigador. A partir do que ouviu, o professor Mali resolveu escrever um
poema sobre o valor dos professores.
O poema chama-se “o que os professores
fazem” (www.taylormali.com). Sua história e várias outras são contadas no livro
Um bom professor faz toda a diferença (2013),
publicado no Brasil pela editora Sextante. O livro do professor Mali não é
nenhuma obra de aprofundamento intelectual sobre educação, escola, professores
e alunos. O professor Mali também não é nenhum Paulo Freire. E tudo isso, junto
e misturado, talvez seja o que torna o livro do professor Mali bastante
interessante. Seu livro, como já vem dito na capa, é uma defesa apaixonada do
trabalho dos professores e os motivos pelos quais precisamos deles mais do que
nunca.
E em pleno século XXI, ainda existe
gente que não sabe o que os professores fazem. Entre outras coisas, os
professores fazem seus alunos imaginarem, questionarem e criticarem. Vejam como
isso é perigoso em épocas de corrupção, autoritarismo e fome de poder! E se
dito dessa maneira, ainda houver quem insista na pergunta “Mas afinal, o que é
que os professores fazem?”. Recorro ao final do poema do professor Mali e
respondo: “Sabem o que os professores fazem?”. “Os professores fazem a
diferença! E você?”.
E se aqueles 57 milhões de crianças não
puderem nunca freqüentar uma escola é por que aos professores continuou-se a
negar a oportunidade de fazer a diferença. E assim sendo, 2030 pode ser tarde
demais.
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