O dicionário Aurélio, edição de 2010, define golpe de
estado como “subversão da ordem constitucional e tomada de poder por indivíduo
ou grupo de certo modo ligados à máquina do Estado” (p.1040). Embora o Aurélio ainda não tenha acordado para a
necessidade de rever conceitos como cigano, homem, negro, judeu e mulher; por
exemplo, nos parece bastante acertada sua definição para a lexia “golpe”.
A definição observada
no dicionário em questão, embora muitos insistam em dizer o contrário, deixa
bastante claro que a deposição da presidenta Dilma Rousseff, no Brasil de 2016,
constitui, sim, um golpe de estado, embora determinados membros dos diferentes
poderes da República assumam o discurso insustentável de que o processo de
impeachment está devidamente reconhecido na Constituição Federal. Quanto a isso
não se pode discordar. Contudo, o modus
operandi utilizado por parlamentares corruptos e indiciados criminalmente,
para depor a presidenta eleita por mais de cinquenta e quatro milhões de votos,
não apenas macula a Constituição, como macula própria República.
O golpe de estado
ocorrido no Brasil de 2016 não é criação tupiniquim. O mesmo tipo de golpe já
havia ocorrido em Honduras e no Paraguai. Os donos do poder perceberam que
soldados, tanques e baionetas não são mais necessários para se perpetrar golpes contra a democracia. No entanto, instrumentos de repressão e cerceamento,
como conduções coercitivas, prisões ilegais, linchamentos morais e torturas
psicológicas nada deixam a dever às práticas dos velhos porões da época da
ditadura civil-militar, que aterrorizou o país de 1964 a 1985. Embora hoje os
agentes sejam outros, os financiadores são os mesmos de ontem. Dessa forma, os
golpistas de 2016 são membros do judiciário, grandes empresários, conglomerados
de mídia e todos aqueles políticos insatisfeitos com as mudanças efetivadas por
sucessivos governos ditos de esquerda, indesejáveis para uma elite que não
suporta ver os membros das classes mais pobres ascendendo socialmente. E como
não conseguem vencer democraticamente, nas urnas, resta-lhes então, a vil cretinice do golpe.
Há a retórica vazia
daqueles que insistem em afirmar que as instituições continuam em pleno
funcionamento. Ora, afirmar isso é tão absurdo quanto afirmar que “todos são
iguais perante a lei”; o que também está lá, bela e recatadamente, na
Constituição Federal. O golpe no mandato da presidenta Dilma Rousseff não é
somente um golpe no mandato da presidenta Dilma Rousseff. É, na verdade, um
duro golpe na jovem, porém frágil e cambaleante democracia brasileira que, a duras penas,
levará muito tempo para se erguer e encontrar seu caminho rumo a sabe-se lá onde.
Por mais que os
golpistas se esforcem para negar e esconder o golpe (muitos deles, na verdade, até se orgulham), o mundo entendeu que, no Brasil de 2016, o golpe é, sim, um golpe. Cientistas e intelectuais como Habermas e Chomsky já o disseram. A imprensa internacional, por sua vez, bem como as redes sociais
também não deixam esquecer que a democracia brasileira ruiu. E, mesmo timidamente, já começam a surgir publicações editoriais que manterão na
história a tomada de poder levada a cabo pela ferocidade das forças reacionárias da
sociedade brasileira.
Nesse sentido,
destacamos a publicação do livro A
resistência ao golpe de 2016, organizado por Carol Proner, Gisele
Cittadino, Marcio Tenenbaum e Wilson Ramos Filho, pela editora Canal 6, em
parceria com o Projeto Editorial Praxis e o Instituto Defesa da Classe
Trabalhadora. A publicação é de 2016 e conta com cento e três trabalhos, entre
artigos e entrevistas, que discorrem acerca dos vários fios que constituem o
novelo do golpe de 2016. A apresentação da obra é feita por Gisele
Cittadino e, entre os vários autores, tem-se nomes como Aderbal Freire Filho,
Leonardo Boff, Guilherme Boulos, Jandira Feghali, Moniz Bandeira, Miguel do
Rosário, Roberto Amaral, Rubens Casara, Tarso Genro, Wadih Damous, Luiz Nassif
e Mariana Souza Pereira.
O livro é bastante
oportuno, uma vez, que se constitui como registro de um dos mais tristes momentos da história
do Brasil (para alguns analistas, mais triste, inclusive, do que os anos de chumbo),
quando o golpe parlamentar empurra o país para o abismo da ignorância, do
retrocesso, do radicalismo e da intransigência e do obscurantismo; resultado um
verdadeiro ataque fascista aos direitos do povo e à democracia brasileira.
Destarte, a leitura de A resistência ao golpe de 2016 se faz
urgentemente necessária como forma de compreensão das causas que levaram ao
golpe, os agentes envolvidos na sua elaboração e manutenção; assim como nos
permite ter uma ideia dos resultados, nada animadores, daquilo que ainda está por
vir.
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Link da editora: http://www.canal6editora.com.br/a-resistencia-ao-golpe-de-2016.html
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Link da editora: http://www.canal6editora.com.br/a-resistencia-ao-golpe-de-2016.html
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